Olhando para a história, é possível destacar um ponto nela em que as duas dimensões que tanto nos interessaram nesse fim de semana - voz e corpo - se cruzam. E um ponto que diz respeito diretamente a algumas pessoas do grupo.
No fim do século XVIII e início do século XIX, uma certa preocupação por parte do poder público europeu começou a aparecer: as trabalhadoras e os trabalhadores industriais das nações européias (vulgos cidadãos) necessitavam de um preparo corporal para aguentar as jornadas de trabalho nos campos e nas indústrias que se multiplicavam nas cidades.
É nesse contexto que vão surgir as primeiras formas, organizadas e justificadas cientificamente, de práticas de exercícios físicos. Essas formas metódicas ficaram conhecidas como Métodos Ginásticos Europeus, desenvolvidos principalmente na França, na Suécia, na Dinamarca, na Alemanha e posteriormente nos Estados Unidos, onde se incorporaram as YMCAs.
Na França, mais especificamente em Paris, destacou-se a figura do Coronel Amoros, que a pedido da Coroa Francesa, construiu um dos primeiros Ginásios da Europa, que na época fazia parte do Real Instituto Pestalozziano, escola destinada inicialmente a formação de engenheiros e oficiais, mas que posteriormente se expandiu para outras classes. E dentro do programa Ginástico de Amoros encontravam-se as aulas de Canto e Expressão Musical.
"O canto era considerado por Amoros como a expresão mais enérgica das paixões da alma, (sendo assim) o instrumento de civilização, de moralização e de regenaração mais poderoso que existe. [...] Seu emprego na ginástica cumpria, assim, dupla finalidade: desenvolver o aparelho respiratório e, ao mesmo tempo, virtudes. É possível inferir que os cantos, mais do que voltados a uma melhoria da capacidade respiratória, buscavam um efeito político de integração social tornando-se , assim, elemento de moralização"*
No século XIX, portanto, os precursores do que hoje chamamos de Educação Física, incluam a voz e o canto como parte de seus conteúdos, como parte das práticas corporais. Mas com uma finalidade e um entendimento um pouco diferentes. Canto como expressão da alma, e não enquanto "produto sonoro do corpo"**. Canto como instrumento de moralização, e não enquanto caminho para a descoberta do corpo que somos.
A presença de exercícios de voz e canto nas práticas corporais aos poucos foi sendo abandonada, por motivos que eu desconheço. E hoje o trabalho com a voz é absolutamente ausente dos cursos de formção em Educação Física.
* Carmen Lúcia Soares. Imagens da Educação no Corpo: estudo a partir da ginástica francesa no século XIX. Campinas: Autores Associados, 1998. p. 34-47
** palavras de Edith de Camargo no curso de Voz e corpo nesse fim de semana
domingo, 16 de março de 2008
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